STF JULGA AÇÕES QUE DISCUTEM CORREÇÃO MONETÁRIA DE CRÉDITOS TRABALHISTAS
01 de setembro de 2020
O Plenário do Supremo Tribunal Federal (STF) reuniu-se em sessão plenária por videoconferência na última quarta-feira (26/08), com a finalidade de julgar duas Ações Declaratórias de Constitucionalidade (ADC) e duas Ações Diretas de Inconstitucionalidade (ADI) em que se discute a aplicação da Taxa Referencial (TR) ou do Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo Especial (IPCA-E) para a correção monetária de débitos trabalhistas e de depósitos recursais no âmbito da Justiça do Trabalho. A sessão de julgamento continuou na quinta-feira (28/08) e foi suspensa, após o ministro Dias Toffoli pedir vista, prolongando o impasse sobre o índice a ser aplicado para correção de dívidas trabalhistas.
Importante ressaltar que a ADC 58 e a ADC 59 foram ajuizadas, respectivamente, pela Confederação Nacional do Sistema Financeiro (Consif) e pela Confederação Nacional da Tecnologia da Informação e Comunicação (ConTIC) e a ADI 5867 e a ADI 6021 foram propostas pela Associação Nacional dos Magistrados da Justiça do Trabalho (Anamatra).
As entidades que propuseram as ADCs pleiteiam que seja declarada a constitucionalidade dos artigos 879, parágrafo 7º, e 899, parágrafo 1º, da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), alterados pela Reforma Trabalhista (Lei nº 13.467/2017), bem como o artigo 39, caput e parágrafo 1º, da Lei de Desindexação da Economia (Lei nº 8.177/1991). Pedem ainda que a Justiça do Trabalho se abstenha de alterar a Tabela de Atualização das Dívidas Trabalhistas, mantendo a aplicação da TR.
O relator, ministro Gilmar Mendes, proferiu seu voto na quarta-feira (26/08), pela inconstitucionalidade da aplicação da Taxa Referencial (TR) para a correção monetária de débitos trabalhistas e de depósitos recursais no âmbito da Justiça do Trabalho. Ao citar precedentes do Supremo, com a ressalva do seu posicionamento pessoal, o relator aderiu ao entendimento majoritário da Corte, para concluir pela inadequação da TR como índice da atualização dos débitos trabalhistas, pois a composição do valor dessa taxa nada tem a ver com correção monetária. No entendimento do ministro, uma vez afastada a validade da taxa, propõe-se que seja utilizado, na Justiça do Trabalho, o mesmo critério de juros e correção monetária aplicado nas condenações cíveis em geral. Essa correção, no seu entender, atende à integridade do sistema normativo infraconstitucional, uma vez que, em regra, na fase de liquidação de sentença, a regra geral a ser observada é a do artigo 406 do Código Civil.
Ademais, de acordo com o relator, todos os pagamentos realizados no tempo e modo oportuno mediante a aplicação da TR, do IPCA-e ou de qualquer outro índice deverão ser reputados válidos e não ensejarão qualquer rediscussão. Por outro lado, aos processos em curso que estejam sobrestados na fase de conhecimento, independentemente de haver sentença, deverão ser aplicados, de forma retroativa, a taxa Selic, juros e correção monetária.
Ainda, o ministro Gilmar Mendes fez um apelo ao Poder Legislativo para que, futuramente, corrija a questão, de maneira a equalizar os juros e a correção monetária aos padrões do mercado e determinar a aplicação da taxa Selic em substituição à TR e aos juros legais.
O ministro Alexandre de Moraes acompanhou integralmente o relator, argumentando que a utilização da TR cria um desequilíbrio na relação obrigacional entre credor e devedor, gerando, de um lado, enriquecimento ilícito e, de outro, ofensa ao direito de propriedade. No entendimento do ministro, o índice de correção deve preservar os valores dos créditos trabalhistas, que têm natureza alimentar, e a previsão legislativa desse índice deve afastar a defasagem entre o valor nominal e o valor real da moeda com o passar do tempo.
Acompanharam o relator, os ministros Alexandre de Moraes, Carmén Lúcia e Luís Roberto Barroso. Já os ministros Ricardo Lewandoswki, Marco Aurélio e Rosa Weber acompanharam o voto de divergência suscitado pelo ministro Edson Fachin.
Em voto de divergência, o ministro Edson Fachin sustentou que o índice de correção que deve ser adotado é o IPCA-E, expressamente registrado na Medida Provisória (MP) 905/2019, a qual perdeu sua validade, considerando que o Congresso Nacional não deliberou acerca da matéria dentro do prazo constitucional.
No voto proferido, o ministro Edson Fachin ressaltou que a correção monetária relativa a depósitos judiciais e créditos decorrentes de condenações, se for atrelada ao índice de remuneração da caderneta de poupança – como a TR e a Selic -, vulnera, além do princípio constitucional de proteção da propriedade, o princípio da isonomia, ao discriminar as partes processuais mais frágeis ou vulneráveis, ou seja, os trabalhadores.
Desse modo, na sessão de julgamento, os ministros chegaram a um empate. Até o momento, oito ministros votaram pela inconstitucionalidade da aplicação da Taxa Referencial (TR) para correção dos débitos trabalhistas. No entanto, permanece empatada a votação acerca de qual índice deverá substituir, a Selic, sem o acréscimo de juros de mora, ou o IPCA-E, defendido pela Justiça do Trabalho.
Após os votos dos Ministros Alexandre de Moraes, Roberto Barroso e Cármen Lúcia, que acompanhavam o Ministro Gilmar Mendes (Relator), e dos votos divergentes dos Ministros Edson Fachin, Rosa Weber, Ricardo Lewandowski e Marco Aurélio, que julgavam integralmente improcedente o pedido, pediu vista dos autos o Ministro Dias Toffoli (Presidente). Ausentes, justificadamente, o Ministro Luiz Fux, impedido neste julgamento, e, por motivo de licença médica, o Ministro Celso de Mello.
Entenda o caso
Nos termos da ADC 59 e da ADC 58, ajuizadas, respectivamente, pela Confederação Nacional do Sistema Financeiro (Consif) e pela Confederação Nacional da Tecnologia da Informação e Comunicação (ConTIC).
A argumentação das partes autoras é de que a determinação judicial da aplicação do IPCA-E, como índice de correção monetária dos débitos trabalhistas, é incompatível com a Constituição Federal. Desta feita, as entidades requerem a declaração de constitucionalidade dos dispositivos trabalhistas (art. 879, §7º e art. 899, §4º), alterados pela Reforma Trabalhistas (Lei nº 13.467, de 2017). Os processos envolvem também a aplicação do artigo 39, caput e parágrafo 1º, da lei de desindexação da Economia (Lei 8.177/91). Os dispositivos, em suma, preveem que deve ser usada a TR.
A nova lei trabalhista estabelece que os débitos relacionados a processos que tramitam na Justiça devem ser atualizados pela TR, índice de remuneração básica da caderneta de poupança. o Judiciário do Trabalho voltou a se manifestar sobre a matéria, agora declarando a inconstitucionalidade do novo preceito.
Ocorre que por muitos anos, houve a aplicação da TR na correção das condenações impostas à Fazenda Pública. No julgamento das ADIs 4.357/DF e 4.425/DF, o STF, com fundamento no princípio da isonomia, determinou a adoção do Índice de Preços ao Consumidor Amplo Especial (IPCA-E) para a correção dos débitos de natureza tributária constituídos contra a Fazenda Pública.
Contudo, a decisão do STF não dispunha sobre a correção dos débitos trabalhistas, constituídos em decorrência de decisão judicial. Tratava apenas de débitos tributários a serem pagos pela Fazenda Pública.
Desta forma, na data de 04/08/2015, o TST adotou o entendimento de que a expressão “equivalentes à TRD”, nos termos do art. 391, da Lei n° 8.177/1991, também deveria ser declarada inconstitucional, por arrastamento, em decorrência do decidido pelo Supremo Tribunal Federal nas ADIs 4.357 e 4.425.
Assim, na mesma oportunidade, o TST definiu que o IPCA-E seria o índice a ser utilizado na atualização monetária dos débitos trabalhistas. A Anamatra resolveu impugnar tal decisão por meio da Reclamação nº 22.012 perante o Supremo Tribunal Federal, mencionada na inicial da ADI nº 5867.
Diante da mudança de orientação do TST, o legislador voltou a atuar e, em 2017, acrescentou o §7º ao art. 879 da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), com o seguinte teor: “A atualização dos créditos decorrentes de condenação judicial será feita pela Taxa Referencial (TR), divulgada pelo Banco Central do Brasil, conforme a Lei no 8.177, de 1º de março de 1991.”
Nos termos da ADC 59, o entendimento é de que a determinação judicial da aplicação do IPCA-E, como índice de correção monetária dos débitos trabalhistas, é incompatível com a Constituição Federal. Não cabe ao Judiciário determinar a aplicação do IPCA ou da SELIC.
Por outro lado, a Associação dos Magistrados da Justiça do Trabalho (Anamatra), ao contrário das ADIs ajuizadas pelas Confederações, pediu ao STF, através da ADI 5867, a adoção da Selic “tal como previsto” para a remuneração dos depósitos judiciais. A Anamatra sustenta a inconstitucionalidade da expressão “com os mesmos índices de poupança” contida no § 4º do art. 899, da Consolidação das Leis do Trabalho. O § 4º do art. 899 da CLT concerne à atualização dos depósitos recursais realizados no âmbito dos processos instaurados na Justiça do Trabalho. Sustenta a Associação que os índices da caderneta de poupança, previstos na referida lei, devem ser substituídos pela SELIC.
O relator, por prevenção, de todas estas ações, é o Ministro Gilmar Mendes.
Assim, acesse a íntegra do voto proferido pelo relator, ministro Gilmar Mendes, bem como a certidão de suspensão do julgamento.
Permanecemos à disposição para demais esclarecimentos que se fizerem necessários.
AGF Advice Consultoria Legislativa, Tributária e Empresarial